Por que devemos tratar a desigualdade no comprimento dos membros inferiores?
Quais os prejuízos que o encurtamento de uma das pernas produz na qualidade de vida da criança e adolescente?
Qual o valor do encurtamento aceitável, sem qualquer prejuízo para as articulações?
A marcha normal, apresenta simetria de movimentos nos membros inferiores, entre o pé que está apoiado no solo (fase de apoio) e o pé que está fora do apoio no chão (fase de balanço).
Esses movimentos dos membros inferiores, permitem que a locomoção ocorra sem desvio vertical no centro de gravidade do corpo, ou seja, sem oscilação do corpo, para cima e para baixo, nos momentos em que apoiamos um pé e retiramos o outro do chão.
A desigualdade no comprimento dos membros inferiores produz alterações significativas na marcha da criança, ou seja, começa a apresentar claudicação (mancar) e, na dependência do valor do encurtamento, sobrecarga mecânica nas articulações envolvidas.
A claudicação apresentada, ocorre justamente porque quando apoiamos o pé do lado curto no chão, existe um desvio para baixo do centro de gravidade do corpo, enquanto que, quando apoiamos o pé do lado longo, existe um desvio para cima do corpo, promovendo assim, uma marcha completamente assimétrica , não harmoniosa e com gasto de energia aumentado.
Existem mecanismos de compensação desenvolvidos pelo próprio organismo que visam minimizar o encurtamento do membro inferior, tentando fazer com que a marcha fique mais simétrica.
Com intuito de tentar alongar a perna curta, dois mecanismos são desenvolvidos:
– A criança começa a caminhar na ponta do pé no lado menor, porque com isso, o apoio da frente do pé no chão faz com que esse lado, durante a marcha, fique um pouco maior;
– Obliquidade pélvica, ou seja, o osso do quadril do lado curto é desviado para baixo, tentando também alongar o membro.
A marcha da criança sofre com as consequências geradas, ou seja, caminha na ponta do pé, no lado curto e tem assimetria na cintura devido à escoliose compensatória desenvolvida (desvio lateral da coluna).
Existe também um mecanismo compensatório que visa encurtar o lado maior, durante a marcha.
A criança deixa de esticar completamente o quadril e joelho no lado maior e com isso tenta fazer com que este lado diminua de tamanho durante a marcha, o que acaba também contribuindo para uma marcha mancando e muito assimétrica.
A criança ou adolescente pode ter dor devido à desigualdade no comprimento das pernas?
Sim, como vimos, o surgimento de escoliose compensatória, sobrecarrega os músculos da coluna lombar causando lombalgia e a obliquidade pélvica faz com que o quadril do membro inferior maior apresente sobrecarga mecânica com surgimento de artrite degenerativa progressiva e dor à longo prazo, desde que o encurtamento não seja tratado.
Qual o valor de encurtamento que produz prejuízo para as articulações?
Estudos revelam que encurtamentos maiores ou iguais a 2 cm são prejudiciais à qualidade de vida do paciente, pois produz degeneração progressiva e dolorosa das articulações, além de um grande prejuízo na locomoção.
Portanto, quando estamos diante de um jovem paciente que tem a previsão de encurtamento na maturidade do esqueleto, maior ou igual a 2 cm, precisamos obrigatoriamente, tratá-lo para que atinja a maturidade com os membros inferiores equiparados no tamanho.
A desigualdade de comprimento das pernas na criança pode ser tratada de diversas formas.
As modalidades de tratamento existentes são:
– Compensação no calçado;
– Inibição do crescimento da perna maior (procedimento cirúrgico conhecido como epifisiodese);
– Alongamento da perna menor (procedimento cirúrgico conhecido como alongamento ósseo);
– Encurtamento cirúrgico da perna maior.
As indicações para cada uma dessas modalidades, dependem de diversos parâmetros.
Precisamos ter informações como:
– Causa do encurtamento;
– Idade da criança, cronológica e óssea;
– Medida atual da diferença no comprimento dos membros inferiores;
– Qual o valor da diferença de comprimento no final da maturidade do esqueleto (para esse cálculo usamos o método multiplicador de Paley);
– Existência de deformidade angular nos membros inferiores, ou seja, joelhos valgo (para dentro) ou joelhos varo (arqueamento das pernas);
– Existência de limitação na mobilidade das articulações que estejam contribuindo para o encurtamento.
No quesito comprimento dos membros inferiores, desigualdades maiores ou iguais a 2 cm precisam ser tratadas para evitar degeneração articular por sobrecarga mecânica, além de tornar a marcha mais eficaz.
Com a análise ortopédica completa do problema, podemos programar o tratamento sempre visando equiparar a diferença no comprimento dos membros inferiores para que a saúde das articulações seja preservada e a marcha corrigida.
Conclusões:
O encurtamento do membro inferior em crianças e adolescentes é um muito assunto importante.
O tratamento precisa ser realizado e uma completa avaliação médica é fundamental para a programação.
A desigualdade no comprimento dos membros inferiores é uma frequente causa de claudicação (mancar).
Um abraço a todos!
Dr. Maurício Rangel é formado em Medicina pela Faculdade Souza Marques (1994) e médico Ortopedista Pediátrico. Trabalha atualmente em consultórios com atendimento ambulatorial e cirurgias ortopédicas pediátricas eletivas. Especialista em diversas patologias musculoesqueléticas em crianças e adolescentes e cirurgias relacionadas.
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