A infância é um período muito importante no desenvolvimento humano, pois é nela que construímos nossas bases. Neste período é “muito mais fácil” aprender uma língua, entrar em um tratamento e apresentar um bom prognóstico, desenvolver talento para uma atividade física, como o ballet ou o judô, e se tornar um atleta no futuro. É na infância que começamos a nos construir como pessoa.
E por carregar esta importância, pode ser um período que causa ansiedade nos pais.
Tem sido cada dia mais comum vermos crianças sobrecarregadas de atividades, mesmo quando são carinhosamente planejadas. Além da escola as crianças, muitas vezes, estão em atividades extracurriculares como aula de música, curso de idiomas para aprender desde cedo uma nova língua ou a natação, para evitar problemas respiratórios e estimular o corpo. Isto me leva a, várias vezes, perguntar aos pais: e quando ele(a) brinca? Quando eles ficam sem fazer nada? E em alguns casos escuto: “Mas Juliana, como assim?”, “Ah, brinca um pouquinho em casa.”, “Brinca na escolinha”.
Todas essas atividades escolhidas pelos pais são realmente importantes. E eu sei que cada um de vocês planeja elas com muito amor e pensando sempre em formar pessoas maravilhosas. Mas criança precisa de tempo de qualidade para brincar e para fazer nada. Lembro que brincar e fazer nada não significa passar o dia todo na frente da TV ou do tablet vendo filme e jogando. Eletrônicos podem ser permitidos, mas o mínimo possível e em situações em que a criança esteja se regulando para uma atividade mais calma, como por exemplo: antes do banho que vai anteceder o jantar. Outra situação aceitável é quando a criança está doente e não pode sair. Ou ainda naqueles momentos de desespero onde o cuidador precisa conseguir tomar um banho, fazer uma comida e a criança não para (vamos assumir que um desenho animado ou um joguinho salva qualquer um na hora do desespero). É importante ter a consciência de que o lúdico deve ser trazido para as crianças: deitar de tarde, ler ou olhar um livrinho, colorir, brincar de lego, correr com os amigos, brincar de pique-pega, faz de conta.
O ócio criativo é um momento muito importante para a construção da criança. É quando sua mente fica livre de informações direcionadas e a imaginação se desenvolve.
É importante que a criança tenha a mente livre e descansada para que sua imaginação se crie, se expanda, se desenvolva. Os conteúdos didáticos são melhor absorvidos, também, quando as crianças têm tempo para ter suas mentes livres de cobranças. A “cabeça fresca” facilita que as informações que lhes foram dadas façam sentido e sejam verdadeiramente absorvidas e não apenas decoradas.
Além do mais, crianças que não têm tempo para um brincar com qualidade são mais propensas ao estresse, que estimula problemas que, infelizmente, têm se tornado típicos da infância, como déficit de atenção, obesidade infantil e problemas de comportamento. Isso deriva de querermos que as crianças tenham muitas atividades, façam muitas coisas. E deriva, também, de nós, quando queremos fazer tudo de forma perfeita e não aceitamos nada menos que isso. São apenas cobranças e mais cobranças.
Devemos permitir que as crianças sejam livres em alguns momentos. Elas precisam de espaço para fazerem descobertas sozinhas, com suas cabecinhas guiadas por suas próprias vontades. Nós adultos somos treinados a achar que as crianças não devem ter vontade. Que somos nós quem moldamos essas vontades. Isso não é bom.
Entendam que ter vontade não é a mesma coisa que não ter limite, não aceitar regras e ordens, não ser educada. Ter vontades e gostos não exclui uma rotina e regras.
Crianças precisam sim de regras, rotinas e atividades estruturadas por nós. Mas sem que roubemos delas o direito de serem crianças. A infância é muito preciosa.
Deixem que seus filhos possam ser crianças. E aproveitem para ser criança com eles. Todo adulto precisa lembrar de sua criança e deixá-la solta também.
Por um mundo com mais pés sujos de terra, joelhos ralados, mãos sujas de tinta, camisas suadas, sonecas à tarde e com brincar de descobrir desenho em nuvem.
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Juliana Pellegrino, Psicóloga formada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2010). É Gestalt-terapeuta pelo Centro de Gestalt-Terapia Sandra Salomão e Terapeuta Familiar Sistêmica Breve pelo Núcleo Pesquisas – Moisés Groisman. Trabalha como Psicoterauta individual de crianças, adolescente e adultos e também faz atendimento familiar e de casal. Trabalha atualmente com intervenção precoce em crianças com desvios no desenvolvimento, com o foco em crianças com possível risco autístico ou já diagnosticadas autistas. Também realiza Grupos Terapêuticos Infantis (enfoque na melhoria de habilidades sociais e estimulo de desenvolvimento) e Grupos Terapêuticos de Adultos (os temas variam de acordo com a demanda, por exemplo: Grupo de apoio à mães de crianças especiais).
Consultório: Largo do Machado, Rio de Janeiro – Brasil
Telefone para contato: (21)98320-4159
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